Ribeiro Gomes Advocacia

No momento, você está visualizando Empresa que Recebe Doação de Imóvel Público e não cumpre com os encargos pode perder tudo o que construiu?

Empresa que Recebe Doação de Imóvel Público e não cumpre com os encargos pode perder tudo o que construiu?

Empresas são o coração de toda cidade!

A geração de empregos e o aumento na arrecadação de tributos são apenas alguns exemplos do que uma cidade pode ganhar ao sediar uma empresa.

Certamente você conhece muitas cidades que possuem o comércio local totalmente voltado para o atendimento de empresas.

Aqui no Estado de Goiás temos vários exemplos!

Não é raro termos notícia de que um Município fez uma doação de área para uma empresa privada para que ela se instale naquela região.

Essas doações podem acontecer tanto para Pessoas Jurídicas de Direito Privado (EMPRESAS) quanto para Pessoas Jurídicas de Direito Público.

Aqui trataremos do recebimento do imóvel por uma EMPRESA PRIVADA.

Antes, preciso te dizer que a Doação é um contrato por meio do qual uma pessoa, por livre e espontânea vontade, transfere seu patrimônio para outra.

Quando tratamos de DOAÇÃO de BEM PÚBLICO o conceito muda um pouco.

Como você sabe, a administração e o desenvolvimento local são responsabilidades do Gestor Público e a possibilidade da Doação de um Bem Público tem previsão na Lei 8.666/93 (artigo 17).

Esse artigo define que a doação de um imóvel é permitida, desde que haja o interesse público devidamente comprovado, avaliação do imóvelautorização legislativalicitação na modalidade concorrência (para a União), doação modal (aquela que tem encargos ou obrigações) e condicional resolutiva (cláusula prevendo a reversão do bem ao Poder Público).

Seguindo: na Doação de Bem Público aquela liberdade dita no conceito acima (“…por livre e espontânea vontade…”) passa por um limitador, que é a finalidade pública, visto que o BEM a ser doado é COISA PÚBLICA.

Por esse motivo, quando o Poder Público faz uma doação, o interesse público deve ser observado, certo?!

Diante disso, volto a pergunta do início desse texto: empresa que recebe doação de imóvel público, mas não cumpre com os encargos pode perder tudo o que construiu?

Depende!

Primeiramente, é preciso termos em mente que essa doação SEMPRE terá ENCARGOS.

Mas o que são estes encargos?

Segundo a doutrina, encargos são condições impostas ao donatário (aquele que recebe a doação) no momento da doação.

Por exemplo: “…a conclusão da Obra de construção da empresa deverá ocorrer no prazo máximo de 02 anos; a utilização do imóvel deverá obedecer …”

Os encargos são diversos e visam sempre a proteção da coisa doada, visto que nela há inerente interesse público.

Essa proteção mencionada acima é a possibilidade que o Poder Público tem de “pegar de volta” a coisa doada, caso não sejam cumpridos os encargos estabelecidos.

Aqui realmente está o ponto de toda a nossa discussão!

Em recente decisão, o Superior Tribunal de Justiça – STJ ao julgar o Recurso Especial nº 1864390 – ES (2019/0280265-0) manteve a REVERSÃO da doação do imóvel, com fundamento na falta de cumprimento dos encargos.

No caso citado, a Empresa beneficiada pela doação deveria no prazo de 12 (doze) meses “(…) legalizar a firma, promover a escritura de doação da área, bem como construção e instalação da fábrica, sob pena de reversão.”

Segundo o Relator do processo Ministro Benedito Gonçalves “(…) havendo o descumprimento do encargo, a reversão do bem doado ao patrimônio público é medida que se impõe.”

Como você pode notar, cumprir os encargos exatamente como disposto instrumento de doação é imprescindível!

Para a formalização da doação, a empresa tem que levar a conhecimento do Cartório de Registro Imóveis o instrumento de doação (Lei Municipal) fazendo constar na matrícula do imóvel, os encargos indicados pelo Ente Público, bem como as cláusulas resolutivas que preveem a reversão do imóvel ao Poder Público.

Pois é. Segundo essa previsão, o Ente Público poderá requerer a reversão da doação com TUDO que tem no imóvel, sem possibilidade de indenização dos valores gastos.

Em recente decisão sobre o tema, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais – TJMG, entendeu que era necessário que um Município, oferecesse CAUÇÃO (em valor equivalente as edificações já iniciadas no imóvel) em uma ação judicial em que era requerida a reversão de uma doação de imóvel.

Isso porque não se pode admitir que a Administração Municipal incorra em enriquecimento sem causa, sendo privilegiada com as edificações realizadas no local.

Vejamos o julgado:

DIREITO ADMINISTRATIVO – AGRAVO DE INSTRUMENTO – DOAÇÃO DE BEM IMÓVEL PÚBLICO – ENCARGOS – DESCUMPRIMENTO – REVERSÃO – IMISSÃO LIMINAR NA POSSE – PRESENÇA DOS REQUISITOS – POSSIBILIDADE – BENFEITORIAS REALIZADAS – NECESSIDADE DE CAUÇÃO REAL OU FIDEJUSSÓRIA. Nos termos do artigo 300 do CPC, para a concessão da tutela de urgência devem restar demonstrados, concomitantemente, a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. O descumprimento dos encargos previstos na lei municipal que autorizou a doação de bem público e a existência de outros donatários dispostos a cumprirem a finalidade proposta pela Administração Pública autorizam a concessão da medida liminar de imissão na posse. Havendo benfeitorias no imóvel doado, é devida indenização ao possuidor de boa-fé, sob pena de enriquecimento sem justa causa da Administração Municipal, de modo que a imissão na posse, ainda que legítima, deve estar condicionada à apresentação de caução real ou fidejussória correspondente às eventuais benfeitorias realizadas, a ser estipulada pelo juízo de origem. V .V.: Ainda que cabível, em tese, a reversão de bem público doado a particular, em razão do não atendimento dos encargos, instituídos para a garantia do atingimento do interesse público intrínseco ao ato, a comprovação do descumprimento, para fins de imediata imissão na posse, ainda que supostamente apuradas as circunstâncias em processo administrativo, uma vez jurisdicionalizada a lide, com a impugnação do réu, que arguiu matéria de defesa, têm-se como imprescindível a submissão ao crivo do contraditório, e da respectiva oportunidade de instrução probatória. É de rigor a anotação de indisponibilidade do bem litigioso, com a respectiva anotação no CRI local, até o julgamento final da demanda. (TJ-MG – AI: 10000191590074001 MG, Relator: Edilson Olímpio Fernandes, Data de Julgamento: 15/03/0020, Data de Publicação: 17/04/2020)

Você pode perceber que, embora haja uma posição firme sobre a reversão do imóvel em que não foi identificado o cumprimento dos encargos da doação, há também a necessidade de se combater o enriquecimento sem causa do Ente Público.

Sem dúvida alguma o recebimento de um lote de terras por uma empresa traz benefícios para todos.

Mas que fique claro: é necessário muito cuidado com o cumprimento dos encargos dessa doação!

Esses podem se tornar um problema para o empresário beneficiado.

O descumprimento de um prazo ou uma destinação do imóvel diferente daquilo que consta no instrumento da doação pode dar motivo para que o Município desfaça todo o negócio e o empresário perca muito mais do que um bem.

_______________

Ficou com dúvida ou tem alguma sugestão?

Envie um e-mail para kaleb@ribeiroegomes.com.br ou deixe seu comentário aqui!

Kaleb Gomes.